sexta-feira, 7 de novembro de 2014

QG DO CRIME MONTADO ATRÁS DAS GRADES



ZERO HORA  07 de novembro de 2014 | N° 17976

A VOLTA DE SECO



OPERAÇÃO TRINCA-FERRO, da Polícia Civil, deflagrada na madrugada de ontem, desarticulou uma central decrimes comandada de dentro da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc). Um dos integrantes do bando é o assaltante José Carlos dos Santos, o Seco, condenado 13 vezes a penas que somam 173 anos de cadeia


Policiais civis realizaram ontem uma operação curiosa: deram voz de prisão a um homem que já está preso, um dos mais conhecidos assaltantes gaúchos, José Carlos dos Santos, o Seco. Condenado 13 vezes, num total de 173 anos de reclusão por roubos a bancos e carros-fortes, ele cumpre pena desde 2006 e teve mais uma vez a prisão preventiva decretada. Agora, porque teria montado um quartel-general do crime, de dentro da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc).

Escorados em um ano de investigação e 70 horas de escutas autorizadas pela Justiça, policiais comandados por Juliano Ferreira, titular da Delegacia de Repressão ao Roubo de Veículo, identificaram cerca de 200 roubos e furtos de carros e caminhões praticados pelo grupo. Afora isso, a quadrilha comandada por Seco detrás das grades clonava veículos, traficava drogas, vendia armas e comercializava explosivos usados em assaltos. Explosões eram a especialidade de Seco quando atuava nas estradas: ele é apontado como responsável pelo uso de dinamite em oito roubos de carros-fortes.

As investigações apontam que Seco virou um consultor para o crime organizado. Repassava informações sobre o uso de explosivos e era o intermediário entre quem queria comprar os artefatos e quem fornecia. Também coordenava a troca de carros e caminhões roubados por armas e drogas no Paraguai. Em uma das escutas, Seco falaria sobre a compra de cordéis – componentes explosivos usados para a detonação. No diálogo, cordéis são chamados de “cordinhas”.

A neutralização do esquema aconteceu com a Operação Trinca-Ferro. Cerca de 150 policiais civis cumpriram na madrugada de ontem 50 mandados (21 de prisão temporária e 29 de busca e apreensão) em municípios da Região Metropolitana e do Interior. Dezesseis suspeitos foram presos até ontem. A Polícia Civil diz que 80 pessoas com participação no esquema foram identificadas.

SUSPEITA DE NOVA FACÇÃO

Os diálogos interceptados desde novembro de 2013 mostram, segundo a polícia, que o bando se preparava para montar uma facção nas cadeias e fora delas. O grupo estaria aliado aos Bala na Cara, o mais novo e agressivo “partido do crime” nas prisões gaúchas – Seco, inclusive, cumpre pena na ala deles, em Charqueadas. Um dos aliados de Seco, Carlos Raimundo Alves Junior, o Ninho, foi flagrado ensinando um comparsa ao telefone sobre como organizar o grupo:

– Ô, meu, tira meu salve (ordem aos bandidos). Tu pode passar a limpo aí no hotel. (...) Faz reunião com os confirmados. Isso aqui é feito para fortalecer, para ter mais respeito, pro cara se unir mais (...). Temos de se juntar, criar outras paradas. É um parâmetro para juntar uns gurizões de respeito. Para dar ideologia certa, para ir se formando e se estruturando, Cabeção. Toda semana vai ter um troquinho.

Levado ao Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), Seco negou as suspeitas e disse que a voz identificada nos telefonemas não é dele. A polícia conta, porém, com antenas de celular e reconhecimento de voz para confirmar que os comandos vinham dele.


 CASA PARA TORTURAR INIMIGOS


O assaltante Seco se negou a falar, mas outras pessoas presas prestaram testemunho e confirmaram as atividades da quadrilha. ZH teve acesso ao depoimento de um dos ouvidos pelo delegado Juliano Ferreira. Ele afirma que Seco está aliado à facção Bala na Cara e que pretende ampliar sua influência no grupo, considerado “de responsa” (que cumpre a palavra empenhada).

O depoente diz também que a quadrilha mantinha em São Leopoldo, no bairro Campestre, uma casa usada, além de esconderijo, para torturar inimigos do bando.

Conforme o depoimento, o local serviu de cativeiro para um bebê sequestrado. A menina teria sido levada para obrigar o pai, um traficante, a pagar dívida com o bando. A criança foi libertada após pagamento do resgate. Seco teria ficado contrariado com o sequestro, por ter sido feito sem sua orientação.

MULHER DE SECO TAMBÉM FOI DETIDA


Certa vez, a residência teria sido invadida por integrantes dos Manos (facção rival dos Bala na Cara), que, por sua vez, torturaram a mulher de Seco, Adriana da Silva Santos Moraes, para revelar onde estaria um dinheiro pertencente ao bandido.

O grupo liderado por Seco tinha integrantes do sexo feminino. A mulher dele foi presa em Montenegro na operação de ontem – ela é apontada como braço direito do criminoso, sendo responsável por transportar entorpecentes. O depoimento confirma que as mulheres eram usadas para levar armas para os esconderijos e até para assaltar. A mulher de Ninho (Carlos Raimundo Alves Junior) foi reconhecida como participante do roubo de uma caminhonete Nissan.

A testemunha dá pistas sobre um dos mistérios da crônica policial: o que foi feito de Michele, ex-mulher de Seco, sequestrada sete vezes por criminosos que queriam colocar as mãos na fortuna acumulada pelos ataques a carros­fortes cometidos pelo assaltante. Ela teria morrido em São Paulo. O depoimento não dá detalhes.


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