sábado, 9 de abril de 2011

DIREITOS HUMANOS - CONTAR COM E TER CERTEZA DE...



A luta histórica pela afirmação dos direitos humanos é o motor para que as pessoas tenham conquistas efetivas. Mas, esta luta encontra entre nós uma fenda [que em alguns casos chega a ser um abismo] entre “contar com” os direitos humanos e “ter certeza de” que os direitos humanos serão efetivos no cotidiano.

“Contar com” direitos humanos é uma condição fundamental que traduz no conteúdo da dignidade humana. Os humanos constroem mediações que expressam o conteúdo a dignidade e chamam a isso de direitos humanos. Este conteúdo é histórico, visto que resulta da compreensão e das práticas que são reconhecidas como aquelas que afirmam o sujeito de direitos com ser em dignidade e direitos humanos. As lutas daqueles sujeitos sujeitados pelas desigualdades, pela exploração, pela violência e pela injustiça é que vai fazendo o conjunto da humanidade tomar consciência e reconhecer novos direitos e também novos conteúdos para velhos direitos. Isto porque a dignidade não é um dado natural aos humanos; é sim uma construção conflituosa que vai sendo afirmada ao longo das lutas e das conquistas históricas. Assim, “contar com” direitos humanos é poder dizer e fazer que a dignidade humana é entendida como um conjunto de garantias que se expressam em direitos humanos. Uma das expressões mais fortes é a jurídico-política. Isto significa que “contar com” é ter os direitos inscritos nas cartas jurídicas fundamentais, de modo particular a Constituição. No Brasil, por exemplo, todos/as contamos com o direito humano à saúde, como direito universal; ele é reconhecido como componente substantivo da dignidade humana e, em razão disso, é parte do ordenamento jurídico-político de sorte que a Carta Constitucional o inscreve como direito de todos/as e dever do Estado.

“Ter certeza de” completa o “contar com” pois é sinônimo de poder materializar a expectativa. Ou seja, aqueles direitos com os quais as pessoas contam, além de estarem no plano do enunciado e do proclamado, também são efetivos, concretos, realizados, no cotidiano. O “ter certeza de” é que faz a dignidade humana não ser um conteúdo abstrato e estranho. Ele completa o “contar com” fazendo com que a dignidade seja vivida, por todos e todas. Assim, continuando com o exemplo anterior, no mesmo Brasil no qual todos/as contamos com o direito humano à saúde, também vivemos, especialmente os mais pobres, com a incerteza de que o sistema de saúde disponibilizará os recursos para que o direito possa ser efetivo. Facilmente não há medicamentos, consultas, cirurgias, tratamentos, enfim, os recursos concretos para que aquele/a que “conta com” o direito humano à saúde possa ter a certeza permanente de que encontrará no posto de saúde, no hospital, no ambulatório, no pronto-socorro, as portas abertas e os recursos suficientes para atender à sua demanda.

Algumas posições mais conformadas costumam aceitar que “contar com” já é um grande ganho e que o “ter certeza de” seria uma construção condicionada às prioridades nem sempre disponíveis, dada a natureza de carência estrutural nas condições atender às demandas por direitos. Cinicamente, com isso, justificam que o “contar com” inclusive anima os sujeitos de direitos, sobretudo os mais pobres, a continuar a lutar a fim de que “tenham certeza de”. Chegam a dizer que se tudo funcionasse não haveria mais motivo para que a cidadania se mantivesse em movimento. Os mais refratários chegam até a admitir retrocessos na efetivação de direitos se as condições exigirem prioridades diferentes como, por exemplo, atender a ajustes macroeconômicos. Contra estas posições levantam-se as vozes que reconhecem que a efetivação dos direitos humanos é progressiva, ou seja, que não se dá de uma vez e nem para sempre, até porque, assim como o conteúdo da dignidade é construção histórica, sua efetivação também o é. Em qualquer hipótese, os direitos não estão disponíveis para serem negligenciados e, em consequência, redundar em vitimização daqueles sujeitos que estão em posição mais fraca e mais vulnerável, colaborando para aumentar outra fenda, aquela que separa os que têm dos que não têm, os que são dos que não são, o que é sinônimo de desigualdade e de injustiça.

Não há motivo para justificativas que venham para aumentar a fenda. Ela precisa, sim, é ser diminuída gradativamente, de forma a fazer com que o “contar com” se traduza cada vez mais em “ter certeza de”. Assim, para quem acredita que direitos humanos são basilares para a constituição de sujeitos históricos e que deveres são deles decorrentes, entre os quais está o primeiro e mais importante de todos os deveres. que é respeitar os direitos de todos/as os/as outros/as, o principal desafio é fazer com que seja superada esta fenda, preferencialmente por seu preenchimento e, senão, com ele, ao menos com a produção de pontes que sejam capazes de permitir trânsito entre estas margens que, a rigor, nem margens deveriam ser.

PAULO CÉSAR CARBONARI- mandado por Claudio Bayerle via email

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